quinta-feira, 21 de julho de 2011

Capitulo 11 - Novas ameaças

   O Sol se punha rapidamente, enquanto a noite deitava o seu manto de sombras sobre todos nós. Já fazia três dias e três noites desde que tudo aquilo começou. Desde que todos começaram a se matar nas ruas. Os ponteiros de meu relógio já não se moviam mais. Eu havia até esquecido de que tinha um relógio em meu pulso.
  Em relação aos sobreviventes... Agora se tornava cada vez mais raro encontrar alguém que não cheirasse a carne podre e não tentasse nos matar em cada esquina.  Diferentemente do primeiro dia, agora nós tinhamos tempo para pensar nas coisas. Pensar e lamentar pelas decisões que havíamos tomado. O homem do hotel não saía de minha cabeça. Ele tinha morrido por nossa culpa.
-Acho melhor fazermos uma fogueira para passar a noite. – Marcos falou, enquanto observava de pé o pôr do sol.
-Eu sei como acender uma fogueira. E também tenho conhecimentos de sobrevivência em geral. A gente pode ficar aqui por algumas semanas, se quiserem. – Lucas disse.
-Valeu MacGyver, mas não será necessário. Eu tenho um isqueiro comigo. - Marcos tirou um Zippo de sua jaqueta. O isqueiro tinha um anjo desenhado em alto relevo do seu lado direito. O anjo da morte. – Além do mais, a gente não vai poder passar muito tempo aqui. Logo eles vão sentir o nosso cheiro, e vão aparecer zumbis por todo o lado. –
- Eu e o Matheus vamos buscar lenha. – Amanda falou. Marcos deu um sorriso malicioso enquanto verificava a munição de sua pistola.
   Lucas e João continuaram a conversar em um canto mais afastado enquanto nós dois caminhávamos matagal adentro. Ela tirava a vegetação do caminho com o seu machado, enquanto eu apenas a acompanhava.
-Acho melhor pegarmos um pouco dessa palha mais fina aqui. – Ela disse, apontando para um punhado de capim seco. –Daria uma boa mecha, não acha?
-Mecha? Você entende de fogueiras, também? – Perguntei surpreso.
-Eu saía para caçar com o meu avô de vez em quando. Ele me ensinou tudo o que eu sei. – Ela disse sorrindo. Avistei alguns gravetos mais distantes que fui recolhendo. -Mas e você? – Amanda continuou. – Qual é a sua história?
   Contei a ela tudo o que havia acontecido até o momento em que a conhecí. Falei de todos os que eu assistí morrer, revivendo cada detalhe daqueles tristes momentos. Falei de Renan, e que eu ainda acreditava que ele estivesse vivo. Contei a ela tudo o que eu conseguí me lembrar.
   Amanda me olhou demonstrando certa compaixão. Entendía a minha tristeza, porque sentía o mesmo que eu. Provavelmente ela deveria saber o que é perder um ente querido. Qualquer um de nós sabia.
   Andei alguns passos em sua direção, carregando a lenha que havia recolhido. Além dos gravetos, tinha pegado também uma tora de madeira que deveria sustentar o fogo por algum tempo. Amanda segurava um bocado de palha fina.
   A noite havia chegado. O céu estava limpo, e a lua brilhava fortemente. Era uma noite estrelada. Acendí a lanterna e iluminei o caminho de volta. Retornamos calmamente pelo mesmo caminho e encontramos todos reunidos, conversando. Estavam parcialmente iluminados pela lanterna traseira do veículo parado.
   Marcos estava sentado sobre a mala de seu carro, com a inseperável garrafa de uísque ao seu lado. Lucas e João estavam de pé. Eles gargalhavam alegremente enquanto uma música saía do carro pela porta aberta.
-Ora, ora... Os pombinhos estão de volta! – Lucas exclamou. Notei que ele segurava um copo de bebida, assim como João. Os dois demonstravam leves sinais de embriaguez.
-Que droga, Marcos! Eles nem tem idade pra beber ainda! – Eu reclamei.
-Não fui eu quem oferecí. Eles dois pediram, e eu não tinha motivo para negar. Agora não tem isso de idade. Bebe quem quiser e acabou. –
   Sem argumentos para uma discussão, comecei a montar uma fogueira. Amanda havia ficado no carro, descansando um pouco. Aquele devia ter sido um dia bem agitado para ela. Pelo menos para mim, foi.
[...]
   Marcos e o resto do grupo estavam sentados em volta da fogueira, assando marshmallows e conversando. Abrímos um pacote de batatas fritas que iríamos comer enquanto o sono não chegasse.
   Amanda saiu do carro após cochilar por pouco mais de uma hora. João estava contando sobre sua família, falando sobre as viagens que costumava fazer. Eu não estava nem um pouco preocupado em ouvir o que ele dizia. Com o crepitar da fogueira, vinham lembranças de minha mãe. A mãe que eu havia perdido. Ví Lucas se levantando.
-Tive uma ideia, pessoal. Que tal a gente contar a nossa história de sobrevivência? Assim passamos o tempo e aproveitamos para nos conhecer melhor. – Ele sugeriu, enquanto olhava para nós. Todos concordaram com a ideia, e assim começaram as histórias.
   Amanda quis começar, e aumentou um pouco o tom de sua voz para que fosse ouvida por todos. Cabisbaixa, ela demostrava certa tristeza em narrar os acontecimentos.
-Bom... Tudo começou em Angra. Pelo menos para mim, começou lá. Eu estava na escola, era um dia normal de aula. Foi quando as coisas mudaram. Um cara entrou na minha sala e simplesmente mordeu uma amiga minha que estava sentada em seu lugar. Jorrou muito sangue. – Uma lágrima percorreu o rosto de Amanda enquanto ela contava a história. – Ainda me lembro de ouvir os gritos da Clarinha. Todos correram desesperados, tentando sair da escola. Quem tropeçasse acabava caindo, e quem caía era pisoteado. Dava pra ouvir as costelas quebrando, foi horrível... Foi horrível... –
- Você não precisa falar se não quiser. – Lucas disse, preocupado com a situação de Amanda.
-Não... Eu vou continuar. – Ela respondeu, limpando as lágrimas com a camisa. - Então eu corrí para a minha casa, sem levar mais nada. Ficava a mais ou menos vinte minutos da escola. Eu cheguei em cinco. Tive o azar de encontrar o meu pai atacando toda a familia. Foi um caos total. Ele já tinha mordido quase todo mundo quando meu avô atirou nele com a escopeta... Mas meu pai se levantou e atacou ele também. Eu só me lembro de ouví-lo dizer para eu vir para a capital, que seria seguro aqui. O resto da história vocês já sabem.
-Sim, nós sabemos. – Disse João, com a expressão abalada. Passamos alguns segundos em silêncio, pensando em sua história.
-Bom... Acho que é minha vez agora. – Marcos se pronunciou. – O início para mim não foi assim tão assustador, porque não assistí ninguém próximo a mim morrer. Então tive a sorte de poder ver tudo com mais calma e estabelecer um plano. Fiquei em casa por muitas horas, esperando que os noticiários dessem boas notícias. Mas foi um mero engano. As coisas apenas pioravam. Ao ver que as evacuações tinham sido canceladas, eu decidí sair de casa. Peguei a minha antiga pistola e acelerei pelas ruas da cidade. Foi aí que pude perceber a verdadeira situação das coisas: No centro da cidade, tudo ardía em chamas. Em Madureira, bairro da capital, havia um trem virado no meio da cidade. Corpos em todos os lugares. Militares corriam e tentavam salvar as pessoas. Em certo momento, eu tentei ajudar... E então pude ver algo que me deixou realmente abalado: Nas fronteiras da cidade, uma criança de mais ou menos sete anos corria em meio à multidão de pessoas tentando passar pelos muros de quarentena. De repente, sem aviso prévio, atiradores começaram a disparar contra os cidadãos. Eles estavam em cima de prédios, com armas equipadas de miras telescópicas. Não havia sequer a chance para revidar. As pessoas íam morrendo uma a uma. E os infectados correndo entre elas. Eu me escondí atrás de um carro, e chamei o menino para vir comigo. Ele apenas me olhou... E foi nesse momento que foi atingido. Morreu antes de cair no chão, com um tiro no peito. –Marcos fez uma pequena pausa. - Isso aqui é dele. – Continuou, tirando um colar de um dos seus bolsos. Em letras de forma, o nome Pedro estava forjado no metal. - Até hoje, penso que eu deveria ter salvado a criança. – Ele finalizou, abaixando a cabeça.
-Está tudo bem, cara. A gente entende você. – Lucas falou, dando leves tapas em suas costas. Eu estava desanimado, e sem a intenção de contar toda a minha história de novo. Então me distanciei um pouco da fogueira e dormí sobre uma cama de palha que havía feito.
   Eu estava em um corredor bem iluminado. Havia uma silhueta humana no final. Era um boneco de papelão com alvos na cabeça e no peito. Entre mim e ele, estava uma pequena mesa branca da altura de minha cintura.  Pelo chão, havia uma marcação, com diversas placas que indicavam a distância. 5, 10, 15 metros... O boneco estava a 20 metros de distância.
-Quando você quiser. – Renato disse, atrás de mim. Abrí a caixa de madeira sobre a mesinha e peguei uma faca. Virei-a e segurei então pela lâmina, fazendo mira. Respirei profundamente por alguns segundos. Eu sabía que Renan estava me observando. Lembrando-me de todos os treinos que havia feito, calculei a velocidade de rotação da faca, e também a distância. Em um impulso, arremessei-a.
   Assistí a faca voar com uma enorme expectativa. Era o meu momento. A lâmina penetrou o boneco sem esforço, próximo ao centro do alvo no peito. Tiro perfeito.
-Boa! – Exclamou Renato. - Agora pegue a faca e traga ela de volta enquanto eu vou dar as instruções de arremesso para o Renan. –
   Adiantei-me em direção ao boneco no final do curto corredor, com passos lentos. Renan estava ansioso para aquele dia, por quê? Tirei a faca do alvo, medindo a profundidade do ferimento.
   Voltei para a posição inicial, onde Renato dava as últimas instruções para Renan. Limpei a lâmina e coloquei-a sobre a pequena mesa com cuidado. Em seguida me recostei a parede atrás deles para observar o lançamento de Renan.
   Ele se concentrou por alguns instantes. Respirou fundo e mirou. Arremessou a faca com vontade: Outro disparo certeiro. Renan virou-se para mim com um sorriso estampado em seu rosto. “Acertei” Ele murmurou para mim. Eu sabía que aquele sorriso não era apenas uma comemoração.
   Um barulho de motor cada vez mais alto se aproximava, o som era quase insurdecedor. Abrí os olhos, que logo foram ofuscados pela luz do dia. Escondí o rosto atrás das mãos por alguns instantes até conseguir enxergar. Por entre os dedos, eu observei a cena: Helicópteros militares voavam rasantes, eram dezenas deles. O som das hélices apenas aumentava. Homens armados com trajes especiais observavam a cidade pelas portas abertas, em uma cena quase surreal.
-Aqui! – Amanda gritava, de pé em cima de nosso carro parado, sacudía os braços tentando atrair a atenção dos militares. As aeronaves passavam por cima de nossas cabeças sem demonstrar nenhum sinal de preocupação conosco. Marcos observava a toda aquela cena sentado sobre o asfalto, com a pistola em mãos.
   De repente, um dos homens apontou arma para nós. Eu pensei que fosse apenas algum tipo de aviso para que não agíssemos contra eles, mas só tive tempo de me jogar para dentro do matagal. O homem fez a mira e disparou uma rajada de forte poder de fogo contra o nosso grupo. Pude ver Amanda correr para longe, enquanto as balas de calibre. 50 penetravam o concreto atrás dela.
   Em estado de choque, fiquei parado enquanto olhava o comboio aéreo se afastar. Tudo ficou em silêncio, como se não existisse mais som nenhum por alguns instantes. Eu observava a estrada por trás do mato, escondido e abaixado.
-Ta todo mundo bem? – Marcos perguntou. Ele estava deitado a alguns metros de distância da pista, envolto pelo capim alto assim como eu. Saí do meu abrigo para ver a situação de Amanda. Ela estava sentada, próxima a fogueira da noite anterior. Olhava para suas próprias mãos, tremendo muito.
-Qual o problema desses caras?! – Ela disse, antes de desabar em choro. Abracei-a e pedí que mantesse a calma.
-O que será que eles vieram fazer aqui? – Perguntou Marcos, enquanto se aproximava. –Não é muito inteligente enviar uma tropa tão grande para o foco da infecção. Eles não arriscariam tantas vidas sem um bom motivo.
-Você acha que eles têm um bom motivo para estar aqui? – Lucas estava intrigado.
-Sim. Mas como vocês viram, com certeza não é por nossa causa. É melhor evitarmos qualquer contato com esse tipo de gente, agora que já vimos o que eles são capazes de fazer. 
-Por que você não atirou neles? – Perguntei.
-Para sermos aniquilados? Não, obrigado. Com a visão aérea eles matariam todos nós sem a mínima dificuldade. Aqueles foram apenas disparos de advertência. Mas pelo menos agora nós sabemos que vamos precisar manter certa distância...
   Marcos interrompeu sua fala ao ouvir o som de motor novamente. Dessa vez ele se aproximava por terra. No horizonte, surgiam furgões pretos. Muitos deles. O plano de evitá-los não parecia ter dado muito certo.
-A gente precisa se esconder! – Lucas gritou, enquanto corría para fora da estrada. Marcos pensou um pouco.
-Se a gente se esconder, eles vão ver o meu carro e nos procurar. Estarão em alerta enquanto nos procuram, atirando em qualquer sinal de movimentação.
-Mata eles então! Eu não quero morrer aqui desse jeito. – Amanda disse exaltada.
-Atirar contra eles? Já viu quantos são? Se você não notou, eu só tenho uma pistola. E eles estarão com armamento muito superior. A nossa única chance... É esperar.
   O comboio agora estava mais próximo. Marcos levantara as mãos um pouco antes de os carros pararem diante de nós. Uma porta de correr se abriu na lateral do veículo. Desceram dois homens armados que miravam em nós. Vestiam roupas especiais, como aquelas contra radiação.
   Usavam fuzis M4A1, equipados de lunetas. Armas feitas para a guerra, utilizadas por muitos exércitos do mundo. Os dois homens se aproximaram lentamente, com as armas prontas para atirar.

-Hands up! – Gritou um deles, com a voz abafada. Vendo que seu comando não havia sido entendido, ele tentou novamente.
-Vocês parrados aí, coloquem as mãos para cima – Ele disse, com um pesado sotaque estrangeiro. Obedecemos a sua ordem e então eles se aproximaram ainda mais. Adiantaram-se na direção de Marcos e algemaram-no. Um deles tirou uma pequena lanterna da roupa e acendeu apontando para o olho dele, como se o examinasse.
   O procedimento se repetiu com todos nós, e então eles nos levaram para o carro. Logo na porta do veículo, um deles nos revistou. Tomaram a minha faca e a arma de Marcos. O restante não estava conosco naquele momento. O machado e a Katana haviam ficado no acampamento provisório. Pude ver as conhecidas iniciais CCAB pintadas em branco no exterior do furgão.
-É só isso? Estamos resgatados? – Amanda perguntou, enquanto nos sentávamos dentro do carro, apertadamente. Um silêncio permaneceu no ar por alguns instantes. Marcos olhou para ela, pensativo.
-Eu não acho que seja isso. –
-Sem converrsa! – Um dos homens gritou do banco da frente.
   O carro tremia conforme acelerava pelo caminho. Nenhum de nós sabia para onde estávamos sendo levados, e a situação se tornava cada vez mais apavorante. Eu sempre fui bom em manter a calma em momentos desesperadores, e isso era até um defeito meu em alguns momentos. Mas foi essa capacidade que me permitiu dormir naquele momento, enquanto esperava pelo desconhecido.

[...]
   Sentindo uma forte dor em meu braço direito, acordei olhando para o concreto. Eu estava deitado no chão, do lado de fora do carro. Estavam todos de pé ao meu lado, caminhando em fila indiana sob o comando de um soldado que continuava com a arma apontada. Será mesmo que eles nos consideravam uma ameaça? Estávamos em um enorme lugar fechado, com cercas em toda parte, onde marchavam soldados de um lado para o outro.
   Cerca de cinquenta metros à nossa frente, havia um enorme edifício, que se assemelhava a uma prisão. Sentí mãos me pegarem firmemente os braços enquanto me levantavam do chão, sem a mínima paciência. Eu estava algemado com as mãos para trás, sem reação. Virei-me contra o agressor e dei um chute na altura de sua barriga. O homem sofria com a dor enquanto eu corrí na direção oposta. Logo muitos deles estavam me perseguindo por dentro do cercado. Tentei correr o mais rápido que pude, porém a única coisa de que me lembro, é a visão de um soldado que corría com uma arma em minha direção. Sentí um forte impacto no alto da cabeça, e então tudo ficou escuro.

3 comentários:

  1. puta q pariu se eu tivesse com minha katana eu ia mata todo mundo!!!!!!(*-*)

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  2. kkkk vc é zika então fico bem legal matheus fico esperando pela proxima parte

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  3. Olha eu lá contando minha triste história.

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